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Brasil Surreal. Automóveis: porque são tão caros? História e soluções

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Final do ano de 2006. Eu, como muitos brasileiros, estava com algum dinheiro no bolso e um desejo: trocar de carro. E aquela propaganda da GM conseguiu chamar minha atenção: “Prisma. Seu primeiro grande carro”. Fui lá conferir a novidade.

Decepcionante. Um Celta Sedan.

Havia muito plástico naquele carro, poucos itens de série, era desconfortável e tinha uma posição de dirigir no mínimo estranha – o volante ficava um pouco à esquerda dos pedais. Aquele carro chamado de “Mini Vectra” pela imprensa era para mim um Celtinha com porta-malas.

De qualquer forma, pergunto o preço: R$30.000,00 (trinta mil reais) a versão básica, chamada de Joy. A vendedora, toda contente, ainda informa que existe uma versão conhecida como Maxx, “top de linha”. Quanto? R$36.000. Com mais alguns opcionais o carro chegava a $39.000 (1)(2). Agradeci e fui embora.

Parece que foi ontem, mas o valor cobrado por um automóvel nacional básico, poucos anos atrás, era esse. E mudou algo? Sim, mudou, para melhor. “Como assim, ficou doido?” você deve estar pensando. Não, explico. Vamos por partes.

Comparativo: Prisma 2007 x Prisma 2014

Sabemos que os índices de inflação nem sempre retratam exatamente aquilo que vemos no nosso dia-a-dia. É normal as pessoas sentirem um impacto na conta do supermercado maior do que o governo divulga. Mesmo assim iremos utilizar a inflação acumulada pelo IGP-M entre Novembro/2006 e Fevereiro/2014, que acumulou 57,19% no período (12), o que faz nosso Prisma Maxx chegar ao ridículo valor de R$ 61.305,79 em valores atuais. Quais carros seriam possíveis comprar por esse valor? Escolha qualquer carro. Compare-o com o Celtinha Sedan 2006 completo e sinta vergonha alheia. Felizmente a GM sentiu e o aposentou recentemente. A nova versão, derivada do hatch Onix, chegou recentemente às lojas. Vamos à comparação: (1)(2)(3)

Tabela comparativa

Item Prisma Maxx 2006 Prisma LT 2014
Motor 1.4 (cv A/G): 97/89 1.4 (cv A/G): 106/98
Trio elétrico X X
Ar-condicionado X X
Direção hidráulica X X
Rodas de alumínio X X
ABS/BAS/EBD - X
Farol de neblina - X
Computador de bordo - X
Entretenimento - Sistema MyLink
Câmbio manual/5 Aut/6 vel.
Suspensão dianteira McPherson McPherson
Suspensão traseira semi-independente semi-independente
Freio (dianteiro/traseiro) disco/tambor ABS/EBD
Pneus 175/65 R14 185/65 R15
Preço R$ 61.305,79 (ajustado) R$ 50.090

Posso ouvir sua mente. “Ok, compramos mais por menos, mas ainda está caro.”, e é verdade. Ao compararmos com outros países, nossos carros continuam bem mais caros. Volto a falar sobre isso em breve, no momento gostaria apenas de demonstrar que nos últimos 7 anos os preços dos veículos cairam e a qualidade aumentou.

Veja na imagem abaixo, do próprio site da GM Brasil, a lista de equipamentos do Prisma atual.

Prisma 2014 preço GM

O que aconteceu para essa melhora?

Voltemos a 3 de julho de 2002. Nesta data foi assinado o tratado de comércio ACE-55 entre o Mercosul e México (4)(5), abrindo a fronteira entre esses países afim de todos obterem vantagens no comércio internacional. Porém, suspeito eu, esse acordo teve mais motivações políticas do que econômicas, pois o Brasil vivia um período de eleições bastante conturbado com a eventual vitória do então candidato Lula. Bolsas caindo e o dólar, disparando, estava cotado a R$3,00 (7). Por isso importar veículos do México era dispendioso. E como o México já tinha acordos maiores com os Estados Unidos e Canadá que além disso produziam carros melhores e mais baratos, exportar era uma remota possibilidade para as montadoras internacionais.

Um ano depois, com Lula já empossado e preocupado em demonstrar ao mercado que era um FHC III, o mercado tenta se ajustar e a recuperar a confiança no país. O dólar demora um pouco mais para voltar a um valor menor frente ao real. Mais dois anos se passam, e a cotação volta a um patamar interessante para que importações valham a pena (R$2,30 em Set/2005) (8). Novidades passam a surgir no nosso mercado: Jetta (Volkswagem), CR-V (Honda), Sentra (Nissan), Fusion e New Fiesta (Ford), 500 (Fiat), Journey (Dodge) e Captiva (GM), dentre outros, passam a circular por nossas ruas. Mais algum tempo e chega a vez dos chineses que, mesmo sem desfrutarem as mesmas vantagens dos acordos com os mexicanos, chegam competitivos. Jac, Effa, Chery e outros surgem nas lojas.

Isso já foi o suficiente para que as montadoras nacionais se movimentassem.

Veja só: nosso mercado é um dos mais fechados do mundo. Mesmo assim, apenas o fato de ter ocorrido uma pequena abertura econômica, tanto pela redução de alguns impostos tanto pela permissão de podermos trazer veículos de fora fez com que os valores, a qualidade e a tecnologia embarcada dos carros vendidos para nós melhorassem. Algo parecido já havia ocorrido no início da década de 1990, quanto até então era simplesmente proibido importar. Lembra-se desse fato? Ficou famosa a observação do ex-presidente Collor que dizia que nossos carros eram carroças (aliás essa é a prova que nem todo mundo está sempre errado). Quer mais? Que tal pagar R$112.000 em 1994 por um Tempra? (9)

Poucos se lembram, mas logo no início do Plano Real, uma das medidas para conter o aumento de preços foi a brusca redução do imposto de importação. Para os automóveis, as alíquotas caíram de 50% para 20% em setembro de 1994. Essa redução vigorou até março de 1995, quando o governo voltou a elevá-las, desta vez dando uma pancada para 70%. Aquele curto período de redução foi suficiente não apenas para atemorizar as montadoras nacionais, que repentinamente viram seus confortáveis lucros evaporarem, como também para trazer um impressionante revigoramento à frota nacional. Os importados tornaram-se comuns principalmente nas ruas de São Paulo, onde desfilavam Rolls-Royces, Corvettes, BMWs, Mitsubishi Lancers, Audis, Alfa Romeos 164, Subarus e Mercedes-Benz C 180, coisa rara no Brasil da época. No Rio de Janeiro, na Avenida das Américas, surgiram nada menos que 20 importadoras de carros se acotovelando para disputar clientes, algo até então inédito. Mas toda essa farra foi interrompida pelo governo em março de 1995, para júbilo das montadoras nacionais, que voltaram a operar sossegadas em seu oligopólio protegido pelo estado. (10)

Voltando a nossa linha cronológica, chegamos em meados de 2009. O dólar cai vertiginosamente contra o real, fechando o ano em R$ 1,74. Isso faz acelerar um pouco mais a importação não só de automóveis mas de uma série de outros produtos. Os emplacamentos de veículos novos, tanto nacionais quanto importados, cresceram em todo o país. Milhões de consumidores saem felizes das lojas em seus carros com cheiro de novo. E como o governo parece não gosta de gente feliz, tiveram que intervir.

A volta do protecionismo

Infelizmente o protecionismo nunca desapareceu, apenas deu uma leve folga. E como já dizia o ex-presidente americano Ronald Reagan, “A visão do governo sobre a economia poderia ser resumida em poucas frases curtas: ‘Se ela se movimenta, taxe-a. Se ela continua se movimentando, regule-a. E se ela para de se mover, subsidie-a’”. Sendo assim, nossos ‘jênios’ comandantes da economia, dentre eles o Ministro da Fazenda Guido Mantega, decidiram que algo precisava ser feito, talvez por não terem notado que a frase acima de Reagan era uma ironia, resolveram levá-la a sério, revendo esses acordos com o México (6): estipulando cotas para as montadoras; tornando mais difícil a vida dos importadores independentes; intervindo mais vezes na cotação do dólar; oferecendo novos créditos subsidiados pelo BNDES; reduzindo pontualmente e por prazo determinado alguns impostos – este último, senão ótimo, algo certamente razoável e bem-vindo. Este é o nosso atual estágio.

“Lucro Brasil”. Isso não é ganância demais?

Com certeza você já deve ter se deparado com alguma corrente de internet divulgando as diferenças de preço e de qualidade dos automóveis no Brasil e no exterior. Não é preciso dizer que, apesar das diversas ondas de melhorias deste cenário nos últimos 20 anos, as diferenças continuam gritantes. Só que agora alguns tentam botar a culpa numa coisa que convencionou-se chamar de “Lucro Brasil” – que seria uma espécie de lucro adicional que as montadoras daqui têm comparando-as com o resto do mundo.

Segundo um estudo apresentado pelo Sindipeças, a margem de lucro das montadoras instaladas no Brasil é de 10%, nos EUA é 3% e a média mundial é de 5%. Ou seja, as montadoras aqui lucram mais do que a média do resto do mundo (11).

Para entender o porquê, muito antes de xingar as montadoras de “gananciosas” por quererem altos lucros – e todo mundo sabe que gananciosos são só os outros; nós nunca somos – é preciso olhar como funciona a carga tributária no Brasil.

Se não houvesse essa enxurrada impostos (IPI, ICMS, PIS e COFINS) e não houvesse também o imposto sobre importação, tanto a diferença de preços que existe graças à alta carga tributária quanto o lucro da montadora certamente seriam acentuadamente menores, o que traria o preço final para perto do preço mexicano – nossa principal baliza – e mundial. Quando há concorrência, especialmente de importados, não dá para colocar os preços nas alturas.

De qualquer forma é curioso notar que os brasileiros condenam o lucro da montadora, que ao menos está lhes oferecendo um bem, e dão passe livre para o esbulho do governo, que em troca lhes dá dois tipos de estradas: as pedagiadas e as esburacadas.

Recapitulando: Não disse que as montadoras são inocentes. Seria ingenuidade dizer isso. Por exemplo, sobre a importação de carros, algo que traria grande concorrência para o setor, incide um imposto que está na faixa dos 35%. Trata-se de um imposto criado justamente para atender aos interesses das montadoras nacionais. Sem esse imposto, o preço dos importados ficaria muito menor, a concorrência seria maior, os preços dos carros nacionais teriam de ser diminuídos e, consequentemente, o lucro das montadoras (já que é com isso que o brasileiro se revolta) seria sensivelmente reduzido. Certamente há um grande lobby, tanto das montadoras quanto dos sindicatos patronais e de empregados para dificultar o máximo possível a importação. Assim como existem crianças birrentas que choram por um pirulito, os lobistas choram para obter vantagens. Só que, em última instância, quem tem o poder de dar o doce são os pais da criança, assim como o governo é quem assina o papel que regula como, quanto, quando e quais tributos existirão nos nossos carros, fabricados aqui ou não. Nos dois casos um simples ‘não’ resolveria.

Ok, digamos que você faça parte daqueles 1% da população brasileira que não gosta de carros. Então fique a vontade para estender este artigo para o produto que você quiser. Troque automóveis por geladeiras ou montadoras por fabricantes de computadores, o raciocínio não muda. O problema para todos eles continua sendo o mesmo: altos impostos; burocracia; protecionismo. Todos eles causados pelo governo.

Neste momento alguém pode ter pensado: “E como ficariam os empregos? Importação livre causaria desemprego!”. Não creio que isso seja verdade, haja visto que, após essas pequenas aberturas, o número de empresas aqui instaladas aumentou bastante. E além disso outros empregos surgiram: mecânicos especializados, importadores, fábricas de auto-peças. A lista é grande. Se você acha que o mercado é sujeito a falhas, perceba que o governo, ao tentar solucioná-las, acaba criando problemas maiores ainda. Clique aqui para entender melhor o que são as falhas de mercado e as falhas de governo

Concluindo

Passamos por três ondas de diminuição de algumas barreiras a livre circulação de mercadorias que revigoraram não só nossos automóveis como muitos outros produtos: no início da década de 1990; de 1994 até 1995; e de 2009 até nossos dias por medidas tomadas em 2002. Não foram ondas tão fortes para que eu, ferrenho defensor do livre-comércio, pudesse ficar plenamente satisfeito, mas foram suficientes para melhorar UM POUCO os preços e a qualidade dos nossos produtos. Agora é torcer para que nosso atual governo pelo menos não ande para trás, pois esperar que PT, Dilma, Mantega entre outros andem para frente talvez seja otimismo demais da minha parte.

Fontes:

(1) http://quatrorodas.abril.com.br/carros/testes/conteudo_183696.shtml
(2) http://quatrorodas.abril.com.br/carros/comparativos/conteudo_196399.shtml
(3) http://motordream.bol.uol.com.br/noticias/ver/2013/02/28/teste-chevrolet-prisma-um-novo-olhar
(4) http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=5&menu=466
(5) http://www.desenvolvimento.gov.br/arquivos/dwnl_1250097797.doc
(6) http://g1.globo.com/carros/noticia/2012/09/brasil-considera-elevar-importacao-de-carros-do-mexico-diz-agencia.html
(7) http://www.portalbrasil.net/indices_dolar02_07.htm
(8) http://www.portalbrasil.net/2005/indices/dolar/setembro.htm
(9) http://www.jalopnik.com.br/quanto-custavam-os-carros-de-ontem-em-dinheiro-de-hoje/
(10) http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1027
(11) http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/1200992-tendenciasdebates-o-lucro-brasil-das-montadoras.shtml
(12) http://www.calculador.com.br/calculo/correcao-valor-por-indice

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Editor FocoLiberal

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